ESCALA DE AVALIAÇÃO DO SENTIDO DE EFICÁCIA DO PROFESSOR APLICADA A PROFESSORAS DOS QUINTO E SEXTO ANOS DE ESCOLARIDADE

José Luis Pais Ribeiro

FPCE-U Porto; ISPA-Lisboa; HGSA-Porto

 

INTRODUÇÃO

O sentido de eficácia do professor refere-se, então, à extensão em que o professor acredita que tem capacidade para influenciar a realização dos alunos (Ashton, 1984). Define-se como uma variável intermediária, composta por uma componente cognitiva e por uma componente afectiva. A componente cognitiva envolve dois aspectos: a) a sensação da probabilidade de que o professor ideal ou normal pode provocar  mudanças positivas nos alunos, b) a avaliação que o professor faz da sua própria habilidade ou capacidade para provocar tais mudanças (Denham & Michael, 1981).

O primeiro aspecto da componente cognitiva tem sido objecto de várias abordagens conceptuais na investigação psicológica e pedagógica. Com efeito, a sensação da probabilidade do professor estatisticamente normal poder provocar mudanças positivas nos alunos pode ser vista como:

a) expectativa do professor relativamente ao aluno:

b)        expectativa do professor relativamente a si próprio.

No primeiro caso pode ser vista como profecia auto-realizada (self-fulfilling prophecy) (Merton, 1948), na qual “uma expectativa inicial errónea pode conduzir à realização de acções que tornem as expectativas verdadeiras” (Good,1987,p32). Ela pode dirigir-se a um aluno particular, a um grupo ou a toda a turma.

No primeiro caso pode ainda ter o efeito de expectativa sustentado na qual “o professor espera que o aluno mantenha os padrões de comportamento mostrados anteriormente, de tal modo que tomam esses comportamentos como imutáveis e não conseguem ver e aproveitar as mudanças potenciais” (Good, 1987, p32).

Ainda no primeiro caso a expectativa do professor pode ser vista como expectativa acerca do resultado do seu próprio comportamento, no sentido proposto por Bandura, que consiste na “estimativa do indivíduo que um dado comportamento produz determinado resultado” (Bandura, 1977, p193).

Estas três formas de considerar a expectativa do professor repercutem-se no seu comportamento. A expectativa de resultado vista como profecia auto-realizada tem sido a que tem dado origem a mais investigações e é considerada a mais importante no contexto educativo.

O segundo aspecto da componente cognitiva - expectativa do professor relativamente a si próprio - é a expectativa de eficácia pessoal. Esta depende “do julgamento (que os indivíduos fazem) acerca de quanto eles estão aptos para actuar com exito em determinadas situações” (Bandura, 1983, p464).

Segundo Bandura (1977) as expectativas de eficácia pessoal e de resultado diferenciam-se na medida em que os indivíduos podem acreditar que determinada acção produzirá determinados resultados, mas se tiverem dúvidas acerca da sua capacidade para realizar as actividades necessárias para chegar a esse resultado, tal crença não terá influencia no comportamento. No entanto, segundo Denham e Michael (1981) ambas as avaliações de expectativas são importantes para o empenhamento do professor.

A segunda componente do sentido de eficácia - a componente afectiva - “refere-se ao sentimento de orgulho ou vergonha associado ao sentido de eficácia” (Denham & Michael, 1981, p39). Esta dimensão é salientada por Weiner (1980) e por Bar-Tal (1978) no modelo atribucional que propõem, como um sentimento de reacção ao resultado da sua acção.

Segundo Lee e Bobko (1994) há cinco modos típicos de avaliar a auto-eficácia, e outros modos que não se coadunam com a teoria de Bandura. O modo aqui apresentado é um dos considerados adequados por aqueles autores.

O sentido de eficácia do professor é um constructo que os investigadores entendem contribuir de modo importante para a percepção que o professor tem da sua prática e da realização dos seus alunos (Denham e Michael, 1981)

A presente investigação propõe-se investigar o sentido de eficácia de um grupo específico, o de professores, para o que se recorre a um questionário com questões específicas sobre as crenças relativas ao ensino como é metodologicamente recomendado na avaliação da auto-eficácia.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Amostra

A amostra do estudo inclui 40 professores dos quinto e sexto ano de escolaridade. Trata-se de uma amostra intencional em que são todos do sexo feminino, têm menos de 40 anos de idade, são professores efectivos ou profissionalizados, participam voluntariamente e leccionam disciplinas em que a interacção verbal é dominante. A escolha de professores com menos de 40 anos visou abranger professores que foram formados após a reforma Veiga Simão. Os 40 professores pertenciam a 10 escolas do distrito do Porto

 

Material

O Teacher Efficacy Scale (TES) é um questionário desenvolvido por Gibson e Dembo (1984) com o objectivo de avaliar o sentido de eficácia do professor. A teoria subjacente ao questionário assume que a eficácia do professor é multidimensional consistindo em duas dimensões que correspondem às do modelo de auto-eficácia proposto por Bandura (1977).

O TES inclui 16 itens que se propõem avaliar dois factores. Um factor inclui nove itens que avaliam o sentido de eficácia pessoal do professor ou, mais especificamente, a crença de que possui a capacidade para implementar os comportamentos necessários para fazer o aluno aprender. Exemplo de um item deste factor é “Se me esforçar consigo ensinar mesmo o aluno mais difícil e menos motivado”. O outro factor representa a crença do professor acerca da eficácia do ensino, ou do seu resultado. Reflecte a medida em que os professores acreditam que o meio pode ser controlado, ou em que podem provocar mudanças nos alunos apesar de factores externos a si próprio, tais como condições de habitação, antecedentes familiares, inteligência e influências parentais. Exemplo de um item deste factor é “o professor está muito limitado naquilo que pode fazer pelos alunos porque o ambiente familiar influencia muito aquilo que eles podem aprender”.

Gibson e Dembo (1984) investigaram as dimensões de eficácia do professor e o modo como essas dimensões se relacionavam com a teoria da auto-eficácia proposto por Bandura (1977). Com recurso à análise factorial identificaram dois factores que se conformam com o modelo de Bandura. O primeiro factor parece representar o sentido de eficácia pessoal do professor, ou a crença que tem de que possui as capacidades necessárias para fazer o aluno aprender. O segundo factor parece representar a crença de que qualquer capacidade do professor para produzir mudanças está limitada pelo meio ambiente e, embora não espelhe exactamente a expectativa de resultado de Bandura aproxima-se deste conceito.

A primeira versão do questionário incluía 53 itens construídos a partir de entrevistas realizadas com 90 professores, e a partir da análise da investigação que abordava características dos professores que podiam ser identificadas de modo semelhante ao sentido de eficácia. Depois de uma primeira análise resultou a eliminação de 23 itens ficando o questionário reduzido a 30 itens.

Os 30 itens foram submetidos a análise factorial da qual resultou a presente escala com 16 itens. Os dois factores referidos explicavam 28,8% da variância total, em que o primeiro explica 18,2% e o segundo 10,6%.

O questionário é de auto-preenchimento em que os respondentes assinalam numa escala tipo Lickert uma posição que corresponde a uma ordenação, em seis posições, de concordância ou discordância com a afirmação explícita, entre “discordo em absoluto” até “concordo em absoluto”. Cada respondente recolhe duas notas do TES. Uma medida de eficácia pessoal, ou de auto-eficácia que varia entre 9 e 54. Quanto mais elevado este valor maior a expectativa de eficácia pessoal. A outra medida de expectativa de eficácia do ensino, ou expectativa de resultado varia entre 7 e 42. Quanto mais baixo este valor, maior a expectativa de resultado. Os valores da consistência interna encontrados pelos autores do instrumento foram de 0,78 para a expectativa de eficácia pessoal, de 0,75 para a expectativa de eficácia do ensino, e de 0,79 para a escala total.

O questionário é de auto preenchimento e não exige condições especiais para ser preenchido. Pode ser passado individual ou colectivamente e as instruções estão escritas na parte superior da folha do questionário. Podem ser dadas todas as informações que forem necessárias. O tempo de preenchimento não chega a 10 minutos.

Os resultados do questionário fornecem informação sobre as crenças do professor acerca da sua capacidade para realizarem um ensino mais competente. Não é um instrumento passível de ser utilizado para fazer diagnóstico.

 

Procedimento

Os Conselhos directivos das escolas eram contactados para autorizarem a realização da abordagem aos professores. Estes eram convidados para participarem numa investigação como voluntários e cujas respostas eram confidenciais. Com os professores nas condições de inclusão que aceitavam participar no estudo era marcado um encontro para preenchimento do questionário. Na data marcada o questionário era-lhes entregue, era preenchido e devolvido ao investigador.

 

RESULTADOS

As características demográficas dos professores são apresentadas no quadro 1

Quadro 1

Variação das respostas, média e variância, da idade, dos anos de profissionalização e dos anos de ensino, da amostra

 

 

range

média

DP

idade

24-40

33,78

3,63

anos de profissionalização

1-12

5,8

3,07

anos de ensino

5-22

10,7

3,36

 

Na investigação em que este questionário foi adaptado, e cuja versão está em anexo, Ribeiro (1988) verificou que esta variável apresentava valores mais positivos para indivíduos com nível conceptual mais positivos, são percepcionados pelos alunos como menos competentes socialmente e recorrem a comportamentos mais autoritários na interacção com os alunos. Estes resultados confirmam os da investigação em geral salientando a importância de se considerar esta variável e de, por isso, a avaliar.

 

DISCUSSÃO

O sentido de eficácia é uma variável emergente passível de ser intencionalmente tornada objecto de intervenção na formação dos professores. A investigação tem demonstrado que os professores com maior sentido de eficácia obtêm melhores resultados na sua prática profissional, considerando resultados de vários tipos.

Embora se trate de uma variável emergente ao invés de uma variável latente, e de dados psicométricos tais como, por exemplo, a consistência interna, a par de outros tipos de tratamento psicométrico, não serem importantes neste tipo de inventários, ela é satisfatória.

O maior defeito do questionário consiste na baixa variância encontrada pela análise factorial do questionário realizada pelos autores ser muito baixa. Com efeito, a variância total explicada pelos factores é muito baixa, tornando-se necessário aprofundar teoricamente o questionário, quer definindo que se trata de uma variável emergente em que os valores de consistência interna e variância explicada não são importantes, ou então têm de se desenvolver melhores itens que aumentem essa variância explicada.

De salientar que, embora os autores se proponham fazer uma avaliação da eficácia do professor numa perspectiva consoante a teoria de Bandura, o segundo factor que identificaram e apresentaram não é idêntico às "expectativas de resultado" de Bandura (1977) que consiste no seu segundo componente do modelo de auto-eficácia.

Trata-se, no entanto, de um instrumento útil para a investigação que deve continuar a ser investigado.

 

BIBLIOGRAFIA

Ashton, P. (1984). Teacher efficacy: a motivational paradigm for effective teacher education. Journal of Teacher Education, 35 (5), 28-32.

Bandura, A. (1977). Self-efficacy: toward a unifying theory of behavior change. Psychological Review, 84(2),191-215

Bandura, A. (1983). Self-efficacy determinants of antecipated fears and calamities. Journal of Personality and Social Psychology, 45(2),464-469.

Bar-Tal, D. (1978). Atributional analysis of achievement-related behavior. Review of Educational Research, 48 (2), 261-267.

Denham, C., & Michael, J. (1981). Teacher sense of efficacy: a definition of the construct and a model for further research. Educational Research Quarterly, 5, 39-61

Gibson, S., & Dembo, M. (1984). Teacher efficacy: A construct validation. Journal of Educational Psychology,76(4), 569-582.

Good, T. (1987). Two decades os research on teacher expectations: findings and future directions. Journal of Teacher Education,38 (4),32-47

Lee, C., & Bobko, P. (1994). Self-efficacy beliefs: comparison of five measures. Journal of Applied Psychology, 79(3), 364-9

Merton, R. (1948). The self-fulfilling prophecy. Antioch. Review,8, 193-210.

Ribeiro, J. (1988). Características dos professores e percepção da sua competência social pelos alunos. Porto: edição do autor.

Weiner, B. (1980, July-August). The role of affect in rational (attributional) approaches to human motivation. Educational Researcher, 4-11


anexo

ESCALA DE EFICÁCIA DO PROFESSOR

(Gibson & Dembo, 1984; adaptada por JLPRibeiro, 1988)

Por favor responda ao questionário apresentado em baixo assinalando à frente de cada frase o 1 se discorda em absoluto; o 2 se discorda moderadamente; o 3 se discorda levemente, mais do que concorda; o 4 se concorda levemente, mais do que discorda, o 5 se concorda moderadamente, e o 6 se concorda em absoluto.

 

 

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6

Quando um aluno faz melhor do que é costume, frequentemente, isso acontece porque eu faço um esforço extra.

1

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6

*O tempo que os alunos passam na minha aula influencia-os pouco, se compararmos com a influência que exerce o ambiente caseiro.

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6

*O que o estudante pode aprender está relacionado em primeiro lugar com o ambiente (cultura) familiar.

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6

*Se os alunos não são disciplinados em casa, eles não são capazes de aceitar a disciplina da escola, ou outra.

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6

Quando um aluno está a ter dificuldades com um assunto, sou capaz de ajustar tal assunto ao nível do aluno.

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5

6

Quando um aluno consegue uma nota melhor do que é costume, isso deve-se a que encontrei uma maneira melhor de o ensinar.

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5

6

Quando eu realmente tento, eu consigo melhorar os resultados mesmo com os piores alunos.

1

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5

6

*O professor está muito limitado naquilo que pode conseguir, porque o ambiente caseiro dos alunos é o que mais influencia os resultados.

1

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3

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5

6

Quando as notas dos alunos melhoram, isso normalmente deve-se a eu ter encontrado maneiras mais eficientes de os ensinar.

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6

Se um aluno domina um novo conceito rapidamente, isso deve-se provavelmente a eu conhecer os passos necessários para o ensino desse conceito.

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5

6

*Se os pais trabalharem mais com os seus filhos eu posso fazer melhor.

1

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5

6

Se o aluno não se lembra da informação que dei na lição anterior, eu sei como aumentar a sua retenção para a próxima lição.

1

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5

6

Se o aluno se porta mal na minha aula, ou se faz barulho, eu sinto-me seguro porque conheço técnicas para modificar esse comportamento.

1

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5

6

*A influência da experiência de cada aluno, pode ser superada por um bom professor.

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Se um aluno meu não consegue realizar uma tarefa escolar, eu deveria estar apto a avaliar cuidadosamente se a tarefa está no nível de dificuldade do aluno.

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4

5

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*Mesmo um professor com boas aptidões de ensino não consegue chegar a muitos alunos.

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6

 

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